O rico vigilante
Em geral, ele se origina do egoísmo e da vontade de gozar dos bens
do mundo em regime de ócio e saciedade.
Mas há quem o justifique com a ideia de dar conforto e segurança
para os seus.
A respeito desse sonho tão comum, há uma narrativa bem
esclarecedora.
Conta-se que
um homem honrado animou-se com o propósito de enriquecer para beneficiar sua
família.
Aflito por alcançar seus fins, envolveu-se em várias
empresas.
Por vinte anos consecutivos, ajuntou moeda sobre moeda, formando o
patrimônio de alguns milhões.
Quando se deu por satisfeito, reconheceu que todos os quadros da
própria vida se haviam alterado.
O lar, dantes simples e alegre, adquirira feição
sombria.
A esposa fizera-se escrava de mil obrigações destinadas a matar o
tempo.
Os filhos cochichavam entre si a respeito da herança que a morte
do pai lhes reservaria.
Os vizinhos, acreditando-o completamente feliz, cercaram-no de
inveja e ironia.
Os negociantes visitavam-no a cada instante, propondo-lhe
transações criminosas ou descabidas.
Servidores o bajulavam, com declarado fingimento, quando ao lado
de seus ouvidos.
Em razão de tantos distúrbios, era compelido a transformar a
residência em uma fortaleza.
Sobrava-lhe tempo, agora, para registrar as moléstias do corpo,
cada vez mais presentes.
Em poucas semanas de observação, concluiu que a fortuna
trancafiada no cofre era motivo de crises sem fim.
A partir daí, passou a libertar suas enormes
reservas.
Junto dele, amigos e vizinhos passaram a ter as bênçãos do serviço
e do bom ânimo.
Desde o primeiro sinal de semelhante renovação, a esposa fixou-o
com estranheza e revolta.
Os filhos odiaram-no e os próprios beneficiados o julgaram
louco.
Todavia, o milionário vigilante passou a possuir no domicílio um
santuário aberto e alegre.
* * *
Essa história pitoresca simboliza a necessidade do equilíbrio na
vida humana, em especial no que tange aos bens materiais.
Toda riqueza que corre, à maneira das águas cristalinas da fonte,
é uma bênção viva.
Já a riqueza em inútil repouso converte-se em poço venenoso de
água estagnada.
Não há lógica em querer um rio inteiro, quando um simples copo de
água pode saciar a sede.
Os bens do mundo são instrumentos e não a finalidade do
existir.
Qualquer que seja a posição do homem, ele enfrenta problemas e
desafios.
Na busca de bens cada vez mais vastos, não compensa esquecer a
essência do existir.
Família, amigos e a própria dignidade constituem o tesouro mais
importante que se pode ter.
Pense nisso.