Arte do Desapego

Há um momento em que é preciso "cortar" os laços com o passado, para que o caminho a seguir fique mais leve. Grande parte das dificuldades que nos aparece não vem das decisões que tomamos, mas das que deixamos de tomar que deixamos em segundo plano que ficarão sem solução por que não nos atrevemos a resolvê-las definitivamente.

Ficamos acomodados e vamos transferindo para depois, para amanhã, para mais tarde. Assim ficamos vivenciando situações que nos levam a um inevitável sofrimento apenas por que nos apegamos a ilusões, fantasias que não resistiriam a uma análise mais acurada da razão que mede, pesa, julga, compara, penetra no mundo das conseqüências e depois chega a conclusões que condizem com a verdade.

Precisamos aprender a dizer adeus ao que não nos serve mais apesar do vazio enorme que fica. Precisamos aprender a usar a arte do desapego que nos poupara de dores bem maiores. Sim é dolorido deixar para trás pedaços de nossa vida, lembranças, momentos, retalhos de nossa história. Amigos, casas, cidades, afetos, projetos, objetos. E resistimos a isso.

Não queremos perder, não queremos deixar partir! Seja o animal de estimação, uma pessoa da família, uma amizade, um relacionamento, uma situação, mas tudo na vida é feito de ciclos que tem começo meio e fim. Na medida em que passam os anos, ficamos mais sensíveis, é difícil olhar no espelho e não ver ali refletido a imagem do jovem que fomos um dia, é difícil virar para o lado e ver esta juventude estampada na face de nossos filhos, netos e compreender que a vida seguiu seu turno e o tempo sulcou nossa face com as rugas profundas, marcas de nossa história.

Mais difícil ainda é reconhecer as profundas cicatrizes que escondemos na alma. Então nos rebelamos e procuramos ciumentamente reter de todas as formas possíveis um pseudo-controle agarrando-nos a situações esdrúxulas, objetos, pessoas e fatos que jamais preencherão o vazio que nos causa a obrigatoriedade desta despedida quando não tem mais jeito por que o sofrimento decorrente tornou-se insuportável. Assim chega o momento em que nos vemos frente a frente.

Este confronto é inevitável... Num ato de derradeira valentia, levantamos a mão e damos o corte final. Então nos vemos mergulhados literalmente dentro de um vazio que não da para descrever. O corpo dormente como anestesiado saímos procurando o refúgio da solidão. Atordoados, um grande silencio se faz em nossa alma, o corpo se queda, fechamos os olhos evitando o próprio pensamento que neste instante preciso só dor nos causaria. É como se por um instante fossemos duas pessoas distinta, o ator e o espectador, e não acreditamos que enfim fizemos o que devia ser feito.

Por um tempo impreciso ficamos assim. Não queremos fazer nada, não há como seguir a vida corriqueira, fechamos os olhos e ficamos ali, suspensos como se o próprio mundo, a vida tivesse parado. A dor vai passar e sabemos que é preciso acertar o movimento do andar e continuar a jornada, permitindo que se vá o que tem que ir e que venha o que tiver que vir.

Por que a vida não para e desapegando abrimos espaço para novas histórias...

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